O acelerado crescimento do atacarejo no país, formato de loja que atende empresas e consumidor final, exigiu mudanças no modelo em operação.
A escalada no processo de migração de consumidores para essas lojas – com produtos 10% a 15% mais baratos do que no varejo – incomoda os supermercados, que sentem a perda de clientes, e obrigou as atacadistas a criar uma estrutura de loja melhor adaptada a este novo cliente.
O portfólio de produtos foi ligeiramente ampliado em algumas categorias – para oferecer número um pouco maior de marcas – e há unidades com padaria, açougue e até ar-condicionado, algo inexistente anos atrás. Aumentou também a exposição de produtos vendidos em apenas uma ou duas unidades, que atende a demanda desse cliente de supermercados. Mas ajustes têm sido feitos aos poucos por causa dos riscos de uma espécie de excesso de sofisticação no modelo.
O atacarejo é um negócio de custos baixos, e há hoje uma atenção redobrada à possibilidade de que mudanças possam afetar a lucratividade. Isso porque o atacarejo tem rentabilidade inferior aos supermercados. Se mudar demais o formato – e se aproximar muito de uma loja de varejo – corre o risco de comprimir margens e ampliar o prazo de retorno sobre o capital aplicado, dizem analistas.
“É um modelo que não pode perder a essência ou fica caro demais. Já coloquei padaria e açougue em loja e voltei atrás, ficava inviável. Mas hoje já se vende portfólio com produtos até sem glúten e lactose, algo que complementa a venda. Dá para ajustar, mas não dá para fugir do que a operação é, custo baixo para ter preço baixo”, disse Ricardo Roldão, presidente da Associação Brasileira do Atacado de Autosserviço (Abaas) e da rede de atacado Roldão.
Em conversa com analistas semanas atrás, Belmiro Gomes, presidente do Assaí, segunda maior rede de atacarejo do país, que autofinancia sua expansão, houve aumento no controle de despesas. “Nosso modelo depende do baixo custo operacional, então foi necessário aumentar ainda nossa rigidez do controle de custo. A despesa fecha o ano [de 2015] em 10,5% sobre venda líquida e 9,74% sobre venda bruta, ou seja, a despesa é menor que um dígito”, disse.
O cenário atual mostra expansão mais forte em vendas das redes de atacarejo, o que ajuda a absorver eventuais aumentos nas despesas. Segundo a Abaas, o setor cresceu 15% em termos nominais em 2015, com vendas brutas em R$ 58 bilhões para as nove empresas associadas da entidade, como Assaí, Atacadão, Tenda, entre outras – as redes líderes desse segmento. Em termos reais, a alta na venda foi de quase 5%. A estimativa é expansão entre 15% a 20% em 2016.
Para efeito de comparação, a Associação Brasileira de Supermercados (Abras), apurou no ano passado aumento de 6,95% nas vendas em valores nominais, e em termos reais, queda de 1,9%. Para 2016, a projeção é de queda real de 1,8% neste ano.
Num período de recessão, com a pior crise no setor de consumo desde o início dos anos 2000, a migração de consumidores para o atacarejo afeta os supermercados, que já sentem o golpe. A Apas, associação de supermercados paulistas, tem mencionado a questão com associados e fez, na semana passada, uma consulta à Secretaria da Fazenda de São Paulo. Quer verificar se o negócio de atacarejo tem alguma vantagem tributária em relação ao varejo convencional. Há pouco mais de um ano, atacadistas tradicionais também começaram a questionar os atacarejos, por venderem ao consumidor sem que ele informe o CPF. No atacado tradicional, o cliente precisa informar o CNPJ para comprar.
Fonte: Valor