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Capatazia não deve compor a base de cálculo dos tributos na importação

A capatazia, de acordo com o artigo 40, § 1º, I, da Lei nº 12.815/2013, consiste na atividade de movimentação de mercadorias nas instalações dentro do porto. Abrange o recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelhamento portuário.

Os valores pagos a título de capatazia, por força do artigo 4ª, § 3º, da Instrução Normativa nº 327/2003 da Receita Federal, têm sido incorporados no conceito de valor aduaneiro sendo, consequentemente, consideradas no cálculo dos tributos de importação, como o Imposto de Importação (II), Imposto sobre a industrialização de Produtos (IPI), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), PIS Importação e COFINS Importação.

No entanto, entendemos que tal disposição da Receita Federal é ilegal.

A base de cálculo dos tributos de importação é o valor aduaneiro, ou seja, o valor da mercadoria importada, mais custos e despesas de transporte e seguro, conforme dispõe o art. VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio – GATT, aprovado pelo Decreto Legislativo no 30/1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355/1994, bem como o que diz o artigo 77 do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009). In verbis:

Art. 77. Integram o valor aduaneiro, independentemente do método de valoração utilizado (Acordo de Valoração Aduaneira, Artigo 8, parágrafos 1 e 2, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto no 1.355, de 1994)

I – o custo de transporte da mercadoria importada até o porto ou o aeroporto alfandegado de descarga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro;

II – os gastos relativos à carga, à descarga e ao manuseio, associados ao transporte da mercadoria importada, até a chegada aos locais referidos no inciso I; e

III – o custo do seguro da mercadoria durante as operações referidas nos incisos I e II.

É evidente que a expressão “até o porto” afasta da composição do valor aduaneiro os gastos com capatazia, vez que estas são despesas que ocorrem após a chegada ao porto. Assim, o artigo 4º, § 3º da Instrução Normativa 327/03 da SRF desrespeita os limites impostos pelo Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio – GATT.

Nesse sentido, a jurisprudência dos tribunais pátrios e inclusive do Colendo Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido o direito de se excluir a capatazia da base de cálculo dos tributos na importação. Vejamos:

 

RECURSO ESPECIAL. ADUANEIRO. TRIBUTÁRIO. CONCEITO DE VALOR ADUANEIRO. IMPOSSIBILIDADE DE INCLUSÃO DO CUSTO DOS SERVIÇOS DE CAPATAZIA PRESTADOS NO PAÍS DE IMPORTAÇÃO APÓS A CHEGADA NO PORTO OU LOCAL DE IMPORTAÇÃO.

1. Para uma correta interpretação do art. 8º do Acordo sobre a Implementação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio – GATT 1994 (Acordo de Valoração Aduaneira), é necessário analisar o sistema de valoração aduaneira como um todo. Decerto, há seis maneiras distintas de se chegar ao valor aduaneiro que devem ser usadas nessa ordem: 1ª) valor de transação; 2º) valor de mercadorias idênticas; 3º) valor de mercadorias similares; 4º) valor pelo método dedutivo; 5º) valor pelo método computado e 6º) valor pelo método residual. Muito embora façam uso de métodos distintos, todas buscam chegar a um resultado que seja uniforme.

2. Não faz sentido algum imaginar que os custos com o serviço de capatazia no país importador não façam parte da valoração aduaneira pelos métodos dedutivo e computado e o façam pelo método do valor de transação. A conclusão correta é que, em todos os casos, a solução há que ser uniforme excluindo tais custos da valoração aduaneira.

3. Assim, o §3º do art. 4º da IN SRF n° 327/2003, acabou por contrariar tanto os artigos 1º, 5º, 6º e 8º do Acordo sobre a Implementação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio – GATT 1994 (Acordo de Valoração Aduaneira) quanto o art. 77, I e II, do Regulamento Aduaneiro de 2009, ao prever a inclusão no valor aduaneiro dos gastos relativos à descarga no território nacional, ampliando ilegalmente a base de cálculo dos tributos incidentes sobre o valor aduaneiro, uma vez que permitiu que os gastos relativos à carga e à descarga das mercadorias ocorridas após a chegada no porto alfandegado fossem considerados na determinação do montante devido. Nesse sentido, já decidiram ambas as Turmas do Superior Tribunal de Justiça no REsp. n. 1.239.625-SC, Primeira Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 04.09.2014, e no AgRg no REsp. n. 1.434.650 – CE, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 26.05.2015.

4. Recurso especial não provido.

(REsp 1528204/SC, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, Rel. p/ Acórdão Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/03/2017, DJe 19/04/2017)

TRIBUTÁRIO. IMPORTAÇÃO.  VALOR ADUANEIRO. DESPESAS OCORRIDAS APÓS A CHEGADA AO PORTO. CAPATAZIA. IN/SRF Nº 327/2003. ILEGALIDADE. COMPENSAÇÃO. 1. A IN/SRF Nº 327/2003, ao determinar a inclusão no valor aduaneiro, de gastos ocorridos após a chegada ao porto de destino, com a capatazia em particular, incidiu em flagrante ilegalidade, tendo em vista que a legislação de regência não contempla tal hipótese. 2. Há margem legal para a exclusão dos gastos com a capatazia, da base de cálculo do Imposto de Importação, porquanto não estão compreendidos no valor aduaneiro.  

(TRF4 5018845-91.2016.404.7208, SEGUNDA TURMA, Relator ANDREI PITTEN VELLOSO, juntado aos autos em 26/04/2017)

Para que a empresa obtenha o reconhecimento da ilegalidade do §3º do artigo 4º da IN SRF n° 327/2003, deve ingressar com medida judicial, objetivando a recuperação dos valores pagos a maior nos tributos incidentes sobre a importação mediante precatório ou compensação com valores de tributos administrados pela Receita Federal.

*MARIANE REIS,
Advogada do escritório Cleverson Marinho
Teixeira Advogados Associados,
especialista em Direito Tributário.

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