Por Dr. Leonardo Luiz Pamplona
OAB/PR 64.589
Sanção por atraso superior a 30 dias no registro de transferência de veículo não enseja suspensão do direito de dirigir
Em virtude de possuir natureza administrativa, a multa por falta de registro de veículo no prazo de 30 dias, disposta no artigo 233 do Código de Trânsito Brasileiro, “deixar de efetuar o registro de veículo no prazo de trinta dias, junto ao órgão executivo de trânsito”; não pode ser utilizada na contagem dos 20 pontos para aplicação da penalidade de suspensão do direito de dirigir.
Como o intuito da suspensão do direito de dirigir prevista no § 1º do art. 261 do CTB é o de impedir que o motorista imprudente continue a dirigir de forma a infringir outras leis de trânsito e colocar em risco a sua vida e dos demais partícipes no trânsito, não pode mera infração administrativa, não praticada quando da condução do veículo, ser somada às demais infrações cometidas para atingir o somatório de 20 pontos.
Tal entendimento já é pacífico no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná e em suas Turmas Recursais, aonde vem se afastando as penalidades de suspensão do direito de dirigir cujos processos administrativos tenham considerado infrações do artigo 233 na contabilização dos referidos 20 pontos.
Destaca-se trecho de decisão proferida pela magistrada Mychelle Pacheco Cintra:
“Em outras palavras, o recorrido não dirigia quando cometeu a infração, que se deu somente pela sua inércia quanto a regularização do registro junto ao DETRAN, diferentemente da prática de infrações diretamente relacionadas a imprudência na direção. Assim, embora a infração de trânsito em questão represente infração grave, nos termos do CTB, sujeita a inclusão de pontos no Prontuário do Condutor, a penalidade de suspensão do direito de dirigir, em virtude de ter o autor atingido pontuação máxima permitida, mostra-se desproporcional.”
Portanto, embora o DETRAN persista em aplicar a penalidade de suspensão do direito de dirigir levando em conta no somatório de 20 pontos os pontos referentes a infrações por deixar de efetuar o registro de veículo no prazo de trinta dias, vislumbra-se que essa penalidade pode ser facilmente revista perante o Poder Judiciário.
JARI DEVE JULGAR EM TRINTA DIAS OS RECURSOS ADMINISTRATIVOS DE TRÂNSITO SOB PENA DE NULIDADE DA MULTA APLICADA
A Junta Administrativa de Recursos de Infração, responsável pelo julgamento de recursos administrativos de multa de trânsito, deve julgar em trinta diasos recursos a ela submetidos, salvo em casos de força maior, nos termos do disposto no art. 285 do Código de Trânsito Brasileiro, sob pena de nulidade da penalidade aplicada pela respectiva infração.
Como os órgãos de trânsito fazem parte da Administração Pública, devem estrita observância ao princípio da legalidade, o que quer dizer que devem fazer estritamente o que está contido na lei. Neste Sentido Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
“Este princípio, juntamente com o de controle da Administração pelo Poder Judiciário, nasceu com o Estado de Direito e constitui uma das principais garantias de respeito aos direitos individuais. Isto porque a lei, ao mesmo tempo em que os define, estabelece também os limites da atuação administrativa que tenha por objeto a restrição ao exercício de tais direitos em benefício da coletividade. É aqui que melhor se enquadra aquela idéia de que, na relação administrativa, a vontade da Administração Pública é a que decorre da lei“. [1]
Mesmo que o Código de Trânsito Brasileiro não mencione expressamente que o descumprimento do prazo de 30 dias resultará no cancelamento da multa, em razão de se tratar de uma penalidade, a interpretação a ser dada é a mais benéfica ao infrator. Também há de se ressaltar que o descumprimento do sobredito prazo importa em ofensa ao devido processo legal, na medida em que não cabe à Administração Pública desobedecer ao devido processo disposto em lei; e caso o faça, estará contaminando de nulidade o ato administrativo, que no caso é a imposição de multa de trânsito.
O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná e suas Turmas Recursais vêm reiteradamente decidindo pela nulidade de multa onde a JARI descumpriu o prazo de 30 dias para julgamento do recurso, por afronta ao art. 285 do CTB, bem como aos princípios da legalidade e do devido processo legal.
Assim, importante que os condutores exerçam seu direito ao contraditório e a ampla defesa ao sofrerem imposição de multa de trânsito. E, caso a JARI descumpra o prazo de trinta dias para apresentar resposta ao recurso, anulidade da infração em comento deve ser a consequência a ser aplicada pelo Conselho Estadual de Trânsito. Ainda, caso não haja êxito na seara administrativa, cabe ao Poder Judiciário a fazer valer este direito do cidadão, caso provocado.
[1] Direito Administrativo. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 62-63.
Leonardo Luiz Pamplona é advogado associado do escritório Cleverson Marinho Teixeira.