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A QUEBRA DA COISA JULGADA E A SEGURANCA JURÍDICA TRIBUTÁRIA

Inserido em: 01/03/2023
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No dia 08/02/2023 o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que uma decisão judicial definitiva (coisa julgada), que garanta ao contribuinte o direito de não recolher determinado tributo de forma continuada, perde automaticamente seus efeitos caso a Corte considere posteriormente que a cobrança é constitucional. Tal julgamento tem gerado muitas discussões e preocupações aos juristas e contribuintes, especialmente diante da possibilidade de tal decisão ser aplicada retroativamente, pegando de surpresa aqueles que confiavam na segurança da coisa julgada.

 

 

CONSTITUCIONALIDADE DE UM TRIBUTO – Diante da complexidade e grande quantidade de normas tributárias brasileiras, é bastante comum que os contribuintes questionem judicialmente a exigibilidade de um tributo, sob o fundamento de este não estar de acordo com a nossa Constituição Federal (CF).  Cabe ao STF dar a palavra final sobre a constitucionalidade ou não de um tributo, o que faz por meio de uma ação direta de constitucionalidade ou por meio da sistemática da repercussão geral, que significa dizer que a decisão proferida em um determinado processo individual deva ser adotada em todos os processos judiciais no território nacional que versem sobre o mesmo tema.

 

 

COISA JULGADA – A coisa julgada acontece quando por exemplo um contribuinte obtém uma decisão final, sobre a qual não caiba mais recurso, em uma ação individual para discutir a exigibilidade de um tributo. Tal situação pode ocorrer antes de o STF julgar o tema em ADI ou em repercussão geral.

 

CASO CSLL – O caso tratado pelo STF no dia 08/02/2023, foi da Contribuição Social sobre o Lucro Liquido – CSLL (RE 94.9297 e RE 955.227, temas 881 e 885). Muitos contribuintes já tinham obtido decisão judicial definitiva garantindo o direito de não recolher a CSLL porque não estaria de acordo com nossa CF. Todavia, em 2007, no julgamento da ADIn n. 15, o STF conclui pela constitucionalidade da contribuição

 

 

IMPASSE –  A partir desta decisão do STF surgiu a discussão sobre como fica a situação daqueles que já tinham obtido uma decisão judicial final garantindo o direito de não pagar a CSLL.

 

JULGAMENTO STF – No julgamento do dia 08/02/23 o STF entendeu que as suas decisões proferidas em ação direta de constitucionalidade ou em sede de repercussão geral têm o poder de quebrar automaticamente a coisa julgada das decisões singulares anteriormente conferidas aos contribuintes. Isto é, a partir da decisão do STF, o contribuinte deixa de estar protegido pela coisa julgada nos casos de tributos sucessivos, ou seja, para aqueles cuja incidência se renova periodicamente, como é o caso da CSLL.  A igualdade tributária entre as empresas foi a principal justificativa para tanto, eis que ao permitir que somente alguns contribuintes não paguem determinado tributo, cria-se uma desigualdade competitiva. Assim, a partir do momento em que a Suprema Corte decide que um tributo é devido, todos têm que pagar, respeitando-se contudo a irretroatividade, a anterioridade anual ou nonagesimal, conforme a natureza do tributo.

TRIBUTOS ÚNICOS – A tese fixada pelo STF não se aplica às decisões transitadas em julgado que garantam o direito de um contribuinte não recolher os chamados tributos únicos, ou seja, aqueles que incidem somente uma vez, tais como o ITBI, que incide sobre a venda de imóvel. Como a relação é única, permanece o direito do contribuinte que tiver obtido decisão favorável transitada em julgada, mesmo se posteriormente o STF vier a decidir de forma contrária sobre o tema.

 

POLÊMICA – A grande polêmica gerada a partir deste julgamento do STF refere-se à modulação dos seus efeitos, isto é, à definição sobre a partir de quando esta decisão sobre a quebra automática da coisa julgada terá efeitos. O pleito dos contribuintes era para que o corte dos efeitos da coisa julgada no caso da CSLL ao menos valesse somente a partir deste último julgamento, o que permitiria que a União cobrasse o tributo daqueles que tinham decisões transitadas em julgado a seu favor apenas a partir de 2023. Todavia, por uma votação apertada de 6X5, tal pleito foi negado.

 

RESULTADO – A decisão que declarou que a CSLL é constitucional foi proferida pelo STF em 2007. Assim, se a quebra automática da coisa julgada se dá a partir da decisão do STF que declara o tributo constitucional, isto quer dizer que as decisões transitadas em julgado que garantiam a determinados contribuintes o direito de não recolher CSLL deixam de ter efeito desde 2007.

 

DESDOBRAMENTOS – Daí surgem as perguntas: Tais contribuintes passam a ter o dever de recolher CSLL desde 2007 ?  Teria se consumado a decadência e/ou a Prescrição ?  Seria aplicada multa e juros?

 

DECADÊNCIA / PRESCRIÇÃO – No que se refere à decadência e à prescrição, deve-se analisar caso a caso, eis que a resposta irá depender do fato de ter havido fiscalização e autuação anteriores. De qualquer forma, o prazo extintivo de 5 (cinco) anos deve ser sempre respeitado.

 

JUROS E MULTA – Quanto a juros e multa, ainda não se sabe qual será a postura da União diante desta situação. Também não se sabe ainda se haverá qualquer definição pelo próprio STF a respeito. Alguns juristas já tem defendido que o fato de o contribuinte não ter pago o tributo fundado em uma decisão transitada em julgado, deve ter o direito de não pagar juros e multa.

 

INSEGURANÇA JURÍDICA – Certamente ainda vão surgir muitas outras dúvidas e questionamentos sobre os efeitos práticos desta decisão. Mas acredito que o maior impacto se deu na confiança e certeza dos contribuintes em relação ao judiciário. A negativa do STF em modular os efeitos de uma decisão tão inédita como essa, acaba por abalar um dos princípios mais fundamentais de nosso ordenamento jurídico: o da segurança jurídica, que tem a função de garantir aos sujeitos de direito um mínimo de tranquilidade e previsibilidade em relação às consequências jurídicas de seus atos. Permitir que esta decisão tenha efeitos sobre o passado corrompe a credibilidade das decisões judiciais, abalando um dos principais pilares de nossa Constituição Federal.

 

 

CAROLINE TEIXEIRA MENDES

Advogada sócia do Cleverson Marinho Teixeira Advogados.

Mestre em Direito do Estado pela Universidade Federal do Paraná.

caroline@cleversonteixeira.adv.br

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